Wednesday, September 30, 2009

Wednesday, September 16, 2009

UM DIA COMO TODOS DEVERIAM SER

Para Fábio Martinelli

Acordar, não ter rotina ou sequer qualquer obrigação a não ser levar minha filha à escola. Abrir a janela e ver um sol que ameaçava sair mas ainda estava tímido. Um dia inteiro pela frente. O que fazer depois de sanada a única obrigação? Esperar? Sim, esperar; não me resta neste momento outra alternativa viável a não ser esperar. Mas como esperar? Esse sim é o desafio.

Uma mensagem guardada há dias em meu celular levou-me adiante. Coloquei minha bota de caminhadas, deixei meu carro na garagem, entrei no metrô em direção ao Largo São Bento. Saí da estação e dei de cara com São Paulo fervilhando. Entrei na Igreja de São Bento e conversei com minha vida tendo como cenário o maravilhoso interior daquela catedral. Atravessei o viaduto da Santa Efigênia em direção à região onde tudo se encontra em termos de áudio, vídeo e computação. MENOS O TAL DO MOUSE SERIAL de meu paleozóico computador Pentium IV - edição limitada 1999. Rodei e passei por todas as lojas até desistir de perguntar se eles tinham o mouse, passando a perguntar se eles sabiam onde eu poderia encontar um mouse serial. Muitas voltas depois, no fim do mundo da Santa Efigênia, quando quase já havia desistido, encontrei uma lojinha que mais parecia ferro de velho de computadores. Finalmente consegui um mouse igualzinho ao meu, totalmente recondicionado - mas quase com as impressões digitais de seu antigo dono - pela bagatela de dez reais. Comprei e ousei perguntar quanto pagariam por minha raridade cibernética: cinquenta reais. Quase troquei meu computador pelo mouse.

Voltei andando e não tomei o metrô de volta na estação São Bento. Passei reto em direção à Sé em busca de um sebo para visitar. No caminho achei a Livraria Imprensa Oficial e lá por uma hora parei para "zapear livros", um de meus maiores prazeres. Segui em direção ao Centro Cultural Banco do Brasil onde não pude entrar na exposição de arte russa porque (FELIZMENTE!) havia milhares de crianças do ensino público municipal em visita guiada e eu só poderia entrar à tarde. Mais adiante dediquei-me à tarefa de vagar pelas ruas do centro (sempre olhando mais para cima do que para o chão) à procura de um sebo. Lembrei-me de meu avô e com ele conversei longamente sobre as mudanças que ele observava na sua "cidade". Encontrei uma pequena placa em homenagem à Adoniram Barbosa no edifício que foi sede da Rádio Excelsior nos anos 40 e 50. Nela se dizia que às sextas-feiras Sâo Paulo habituava ouvir o programa de Adoniram que ia ao ar às oito horas da noite.

Totalmente absorto em meus pensamentos, na Rua Paulo Egídio, achei o sebo do Elias onde passei por tantas capas conhecidas de disco de vinil, livros fantásticos e DVDs que eu adoraria "rapar" e levar para casa. Um passeio entre estantes e prateleiras do tempo que me levaram à minha infância. Encontrei os discos de 45 rotações com historinhas para crianças que tanto ouvi em uma vitrolinha cinza da qual tenho agora a nítida fotografia. Procurei um livro de Calderón de la Barca e não o encontrei. Segui para outro sebo e logo depois para outro, mas assim mesmonão achei. Próximo da hora do almoço, tomei o metrô na Sé e voltei realizado para casa. Voltei com a sensação de estar mais vivo e pulsante do que nunca, MUITO mais vivo do que se estivesse atrás de uma mesa ou computador para trabalhar. O computador é bom para acessar o mundo e com ele se relacionar. É bom para escrever, não planilhar.

Meu querido amigo Fábio, confirmei hoje algo de que sempre desconfiei: trabalho é TROCA e o dinheiro, apenas e tão somente, o meio. Vida encontro eu escrevendo, lendo, vagando por meus incompreendidos pensamentos e, acima de tudo, bebendo da fonte das artes, que alimentam minha alma. Vida tenho eu fora da relação de troca mercantilista que há tantos anos apenas se repete sem que sua essência seja transformada. Vida tenho eu amando a vida e a novidade em que ela pode se transformar a cada dia - DESDE QUE ASSIM DESEJEMOS.

Um grande abraço. Graças a você tive hoje um dia como todos deveriam ser.

PS: mas já que a porra do dinheiro é necessária, que alguém me contrate logo cacete!!! (rsrsrsrsr).

OLHA O QUE EU ACHEI!!!



Deliciosamente perdido pelo Sebo do Messias, de repente, dei de cara com uma miníscula caixinha de sapatos onde reconheci estes disquinhos que marcaram a minha infância. Não tive dúvida: sem pestanejar passei a mão nas duas historinhas que eu mais gostava: Pedro e o Lobo e Branca de Neve. Não tenho onde "tocá-los", mas os comprei com a intenção de mostar para minha filha o que era a minha diversão em tempos sem DVD, Discovery Kids ou video-games. Espero que, por serem coloridos, e, se ela deixar, eles possam enfeitar alguma estante de seu quartinho.

Quando fui pagar tomei um susto. Quase não tive dinheiro:

R$1,00


Tomara que, se eu encontar uma vitrola, eles aindam emitam algum som que não seja o de riscos (hei, alguém aí se lembra da agulha "enroscada" e do som de um disco riscado?)

DICA DE LIVRARIA

Para quem gosta de boa leitura, segue a dica da Livraria da Imprensa Oficial. Existem algumas unidades na capital e outras no interior, onde se pode achar livros editados pela Imprensa Oficial do Estado.

www.imprensaoficial.com.br/livraria

Conheci a livraria que fica na Rua XV de Novembro, bem no coração do centro. Um espaço agradável, porém nada sofisticado, sem café ou lugares confortáveis para se sentar. Nada de CDs ou DVDs. Uma autêntica livraria. Livros, muitos livros. Por todos os cantos livros e SOMENTE LIVROS! Um acervo interessante com publicações que procuram preservar e manter nossa história. Vários títulos sobre política, sociologia, artes, história e geografia editados pela Imprensa Oficial e pela Eitora da USP (EDUSP). Em uma "rodada", vaguei pelas trincheiras e atos heróicos da Revolução de 32 em um livro maravilhoso sobre esta romântica passagem de nossa história. Li parte do roteiro do filme "Chega de Saudade" em um livro que faz parte de uma coleção que tem os roteiros originais de vários filmes do cinema nacional. Vi os dados técnicos das bacias hidrográficas de São Paulo, entrei no túnel do tempo e fui até a cidade de Santos no apogeu da era cafeereira. Relembrei a época em que meu pai foi político lendo uma homenagem biográfica ao Governador Franco Montoro.

Em poucos metros quadrados, uma deliciosa viagem inspirada pelos ares (não apenas poluídos, mas, para mim, românticos!) do centro da cidade.

Vale uma visita. Física de preferência.

Mas, se não for possível, uma visita virtual (www.imprensaoficial.com.br/livraria) possibilitará a compra de livros que não se encontra com muita facilidade nas grandes livrarias.

A SÃO PAULO QUE NINGUÉM VÊ




De cima do Viaduto do chá tirei esta foto: mendigos em cima do túnel do Anhangabaú. Quantas pessoas escondidas nesta miséria existem em nossa cidade? Devem haver muitos esconderijos como esse onde nossa fragilidade social é tragicamente exposta.

Friday, September 11, 2009

AVISO AOS NAVEGANTES VIRTUAIS

Quem estiver navegando virtualmente e por aqui passar, ATENÇÃO:

ÁLCOOL (em gel ou líquido) NÃO MATA VÍRUS! MATA APENAS BACTÉRIAS.

Portanto não se iludam: esta história do álcool gel é apenas mais um oportunismo comercial desenfreado que está fazendo muita gente NADAR em dinheiro.

Ao higienizar suas mãos utilizando álcool com certeza você está se protegendo:

MAS COM CERTEZA NÃO CONTRA O VÍRUS A/H1N1.

Álcool gel não nos imuniza do A/H1N1.

ISTO É UMA GRANDE BALELA!!!!

Wednesday, September 09, 2009

CERTEZAS VIRTUAIS

Não vivo mais sem o YOU-TUBE e meu BLOG!!!!

ABERTURA DA COPA SIM, MORUMBI NÃO.

Finalmente parece-me que o bom senso está prestes a prevalecer sobre a política. Ao que tudo indica o estádio do Morumbi (alçado à condição de "arena" na terminologia do marketing das copas) não sediará a abertura e os jogos de semifinal da copa de 2014 se ela vier a acontecer aqui no Brasil. Sempre fui contrário à realização da Copa do Mundo ou mesmo das Olimpíadas em nosso país, mas o fato de eu não desejar a realização de jogos da Copa no Morumbi não tem nenhuma relação com esta opinião. Sou contrário à realização de jogos no Morumbi por uma experiência prática que vivi este ano durante a disputa da Taça Libertadores da América.

Em uma quarta-feira de junho, aceitei o irrecusável convite de um primo para assitir ao jogo do São Paulo contra o Cruzeiro nas oitavas de final da Libertadores. Mesmo sabendo que provavelmente meu time iria perder(o que acabou por se confirmar em uma vergonhosa e revoltante derrota do São Paulo), topei a parada porque era para ir na cativa. "Esquema patrão", no jargão de adolescente de meu primo. Recebi seu telefonema no celular praticamente em meio a uma reunião, mas consegui aceitar seu convite feito no intervalo de suas aulas matinais. À tarde, com mais calma, combinamos o encontro na casa de um amigo dele no bairro de Moema. Horário previsto: sete horas da noite. Naquela época trabalhava me Alphaville e calculei que, saindo ás 18 horas em ponto, uma hora seria suficiente para eu me deslocar até Moema.

Pois bem, naquele dia, como bom torcedor fanático, às seis horas em ponto apertei a tecla "F", desliguei o computador, deixei meu chefe e subordinados falando sozinhos e botei o pé na estrada. Alguns kilometros da Rodovia Castello Branco ainda me esperavam pela frente. Surpreendentemente não tive qualuquer problema para enfrentar os exatos vinte e dois kilometros que separavam do início da Marginal do Rio Pinheiros. A expectativa era grande quanto às condições que encontraria nesta tradicionalmente congestionada via de acesso à cidade de São Paulo. Uma vez mais a sorte estava ao meu lado. Do meu escritório até a Ponte Cidade Jardim, trinta inacreditáveis minutos, como se fosse um sábado. Poucos miutos depois já estava na Avenida Faria Lima. Beleza, pensei eu, vai dar tudo certo. Vamos chegar bem antes do jogo e conseguir um ótimo lugar. Minha alegria, porém, durou pouco. Ao entrar na Avenida Faria Lima, próximo das quinze para as sete, o trânsito "empacotou". Demorei uma hora e meia para fazer um trajeto que normalmente demoraria, no máximo, vinte minutos para percorrer. Nesta uma hora e meia meu celular se transformou em um GPS com meu primo me ligando para saber onde estava.

Muitos telefonemas depois apanhei meu primo e seu amigo e iniciamos uma verdadeira jornada em direção ao Morumbi. Não havia alternativas, tomos os caminhos estavam travados. Saía de uma rota, entrava em outra pior ainda e depois me encalacrava no desespero de tentar chegar a tempo para assistir ao jogo. Carros com bandeiras, Kombis e ônibus estavam parados ao nosso lado no mesmo frenesi de atingir a "arena" tricolor. Mas nada adiantava, todo nosso esforço era em vão. Simplesmente não andávamos, não movíamos o carro nem um metro. Cheguei por diversas vezes a desligar motor do carro para evitar aquecimento e economizar combustível. A tensão foi aumentando e o tempo passando. O rádio ligado derramava ainda mais adrenalina em nossas veias. E nada era capaz de fazer o trânsito andar. Depois de inacreditáveis duas horas (de Moema ás proximidades do estádio do Morumbi), paramos o carro na garagem do apartamento de um amigo do meu primo e fomos, literalmente correndo, até o estádio para nos acomodarmos, aos vinte minutos do primeiro tempo, em meio ás já lotadas cativas do Morumbi. Foram quatro horas e meia desde que havia saído de meu escritório até sentar-me nas escadas do setor de cativas.

Esta experiência me fez pensar em como ficaria o trânsito na cidade de São Paulo no dia de uma abertura de Copa do Mundo no Morumbi. Se em um simples jogo de oitavas de final da Taça Libertadores da América, com um público de 55.000 torcedores, todos os acessos ao bairro do Morumbi (entenda-se pontes) e as vias locais (depois que a travessia havia sido realizada) estavam TOTALMENTE INTRANSITÁVEIS, como seria em um jogo de Copa do mundo? Se não estivesse estacionado em uma garagem particular, passaria os 120 minutos do jogo circulando ao redor do estádio à procura de uma vaga. E, se nao tivesse ido de carro, JAMAIS conseguiria chegar utilizando algum meio transporte público.

Por mais política ou projetos que se faça,ao menos que se ponha abaixo o bairro do Morumbi, não hão há qualquer viabilidade para se adaptar o atual estádio ás exigências da FIFA. Quando foi construído , o estádio ficava em uma área semideserta da cidade que, naqueles dias, poderia perfeitamente abrigar as reformas hoje exigidas pela entidade máxima do futebol mundial. Hoje, porém, isso é impossível e realmente impraticável. Não sou arquiteto urbanista, engenheiro civil ou de tráfego, mas basta o mínimo de bom senso para perceber que a "arena do Morumbi" é apenas uma terminologia de marketing para envelopar um velho estádio encravado no meio de um dos mais nobres bairros da Cidade de São Paulo. Bairro este que, diga-se de passagem, já está superpopuloso e cuja estrutura viária, implementada há quase quarenta anos, não mais atende a população local. Em termos de estacionamento, a menos que se faça locação de garagens particulares dos prédios vizinhos ao estádio, não há como criar o número mínimo de vagas necessárias para os veículos de torcedores e imprensa. Quanto ao transporte público, o único meio de transporte viável é o férreo pois a utilizaçõ de ônibus causaria ainda mais trânsito. A estação de trem na Marginal do Pinheiros fica a muitos kilometros do estádio e a futura estação de metrô da Vila Sônia ficará a mais ou menos um kilometro e meio do estádio. Dizem que há um projeto de fazer a ligação térrea da estação de metrô ao estádio, mas onde colocar um terminal capaz de receber o fluxo de passageiros do metrô?

Não conheço o novo projeto apresentado pelo São Paulo e por São Paulo para a FIFA. Mas, por melhor que ele seja, dificilmente evitaria um caos metropolitiano caso o Morumbi venha a sediar a abertura da copa. Sou sãopaulino e paulistano. Tenho orgulho de meu time e da minha cidade. E por isso mesmo não gostaria de ver um fracasso exposto na vitrine da imprensa mundial. Se a Copa vier para o Brasil a cidade de São Paulo certamente mereceria sediar sua abertura, mas não no Morumbi. E sim em uma verdadeira "arena" à altura da grandeza de nossa cidade.

Thursday, September 03, 2009

A HISTÓRIA DA GUITARRA E DO ROCK



Para minha filha Beatriz


Era uma vez um senhor que gostava muito de música. Ele vivia em uma pequena casa afastada da cidadezinha onde muitas pessoas o conheciam por Luthier. Muito mistério e diversas histórias envolviam a vida deste pequeno homem de mãos calejadas e corpo corcunda. Todos diziam que em sua casa ele guardava um segredo que jamais seria revelado: a arte de fazer instrumentos.

Certa noite, muito cansado, com fome e sede, um músico solitário passou em frente à casa do Luthier. Vendo a única luz acesa no meio daquela estrada escura, ele resolveu bater palmas e arriscar para ver se alguem lhe daria abrigo. Quando já estava quase resolvendo ir embora o dono da casa apareceu e perguntou o que o forasteiro desejava. Ele respondeu dizendo que estava à caminho da cidade mas que já não aguentava mais andar e precisava de um lugar para dormir. O velho senhor recusou a estadia dizendo que a cidade estava perto e não custaria muito para ele chegar até lá. Mas o viajante disse que estava muito cansado, que havia caminhado o dia inteiro com apenas um cantil de água e que estava exausto. Reclamou também do peso de seu violão que carregara ao longo da jornada.

Ao perceber que se tratava de um músico, imediatamente o senhor abriu o portão de sua casa e convidou o jovem a entrar. Ofereceu-lhe um copo de água, colocou-o sentado em sua mesa e dirigiu-se a fogão de lenha. Aproveitando as brasas vermelhas que aqueciam o ambiente, remexeu a sobra de sopa que ainda estava na panela e serviu o incrédulo músico que ainda não sabia o tamanho de sua sorte.

Enquanto tomava a sopa na caneca colocada entre as frias mãos, o músico olhou ao redor o percebeu uma série de instrumentos de corda pendurados nas paredes. Observou também pedaços cortados de madeiras nobres e cordas espalhadas por todo os cantos da casa. Viu partituras em cima de uma mesa e muitas fotos de músicos com instrumentos de corda. Fascinado perguntou a seu hospedeiro se ele trabalhava com música e ficou surpreso quando o velho senhor lhe respondeu que apenas gostava muito de música. No mesmo instante o músico se levantou, correu em direçao ao seu violão e começou a tocar uma linda canção. Disse que estava à procura de um lugar para tocar suas músicas na cidade e que havia fujido de casa pois seus pais não queriam que ele seguisse seu dom artístico.

Tocado por tão lindos acordes, o senhor se levantou, correu em direção aos fundos da casa e mostrou-lhe uma casinha que ficava meio escondida no quintal. Acompanhou-o até lá e, abrindo a porta, mostrou o estúdio onde fazia seus instrumentos. Disse que ali moravam os segredos de mais de cinco gerações de luthiers que passavam sua arte de geraçao em geração. E que, era para pessoas com a sensibilidade musical daquele "garoto" que ele sonhava trabalhar. Entre suas várias ferramentas tomou em suas mãos o pedaço da melhor e mais nobre madeira, colocou-a sobre a mesa e começou a entalhar as formas de um violão. Foi quando, de repente, os dois foram surpreendidos por uma voz que ainda não sabiam de onde vinha:

- Para que o senhor está me formatando?

Olhando assustados para os lados e ainda procurando de onde poderia vir a voz, escutaram novamente:

- Para que o senhor está me formatando? Olhe para baixo, sou eu, o pedaço de madeira que está falando.

Muito intrigado o luthier respondeu:

- Você é o melhor pedaço de madeira que tenho, a mais nobre de todas que tenho aqui em meu estúdio. Vou construir um violão especialmente para este jovem músico, dono de um estraordinário talento musical.

Rapidamente, e com muita convicção, a madeira lhe disse:

- Senhor, não nasci para ter o mesmo destino de todas as outras madeiras. Não quero ter o mesmo formato e o mesmo som. Sei que os violões, os violinos e as violas que o senhor constrói são muito nobres e seu som maravilhoso. Mas eu queria fazer um som diferente, tocar acordes e melodias que ainda não foram tocados. Queria ser um instrumento diferente dos outros.

Pensativo o luthier respondeu, pedindo a cumplicidade do jovem músico.

- Mas seu fizer um instrumento diferente, quem vai tocar?

A resposta foi rápida:

- Eu toco. Com um instrumento novo posso desenvolver minha criatividade musical.

Ainda indeciso, o velho senhor dirigiu-se ao pedaço de madeira querendo entender que tipo de instrumento ela sonhava ser.

- Gostaria de ser um instrumento que tocasse junto com outros instrumentos, mas não em orquestras, como já existem tantos. Gostaria de poder ser a base para outros instrumentos e ter um som bastante agudo.

Olhando para o músico, o senhor perguntou:

- E você, que tipo de música pensa em fazer?

- Acho que poderia fazer uma música com muita força e muita energia, juntando alguns instrumentos para fazer as pessoas dançarem e se sentirem muito bem. Uma música que reuna as pessoas e mostre seus reais desejos. Na realidade, sempre pensei em criar um tipo de música que possa ser uma filosofia de vida.

Circunspecto e pensativo, franzindo a testa, porém já decidido, o luthier aceitou o desafio dos dois e disse:

- Muito bem....deixem-me pensar. Parece uma tarefa bastante difícil, mas nada impossível. Tenho que encontrar em uma nova forma para este instrumento. E cordas também. Mas acho que posso fazer.

Ali mesmo, sem perder nem um minuto, debruçou-se sobre sua mesa com todas as ferramentas de que dispunha e entregou-se com muita dedicação à tarefa. Trabalhou dias e noites à fio quase sem descansar até chegar ao resultado final: um lindo instrumento de cordas com bastante potência e sensibilidade que resolveu batizar de guitarra.

O som era lindo e potente e o músico rapidamente tomou-a em suas mãos. Era muito parecida com seu violão e ele rapidamente conseguiu adaptar-se ao novo instrumento. Durante dias, ao lado do senhor luthier, movimentou suas mãos rapidamente pelas cordas da guitarra criando acordes nunca antes emitidos por um intrumento de cordas. Exercitou sua sensibilidade pensando no desejo daquele pedaço de madeira que sonhara ser um instrumento diferente. Levou a sério a vontade de criar um novo tipo de música. E assim, tomado por seu sonho, partiu em direção à cidade para procurar um lugar para tocar.

Chegando no pequeno vilarejo, bateu de porta em porta até encontar uma chance em uma estalagem que abrigava viajantes e precisava de alguem para entretê-los. Muito nervoso, na sua primeira noite o músico abriu a caixa e de lá tirou um instrumento desconhecido que ninguem queria ouvir. Mas ele insistiu e começou a tocar as músicas que havia criado com seu mestre luthier. Pouco tempo depois o espaço da estalagem tornou-se pequeno para tanta agitação. Além dos hóspedes, pessoas que passavam pela rua, atraídos por um som tão potente e cheio de vibração, começaram a entrar para ver do que se tratava. Os vizinhos, curiosos, também pediram para entrar.


As noites seguintes foram bastante agitadas e cada vez mais pessoas se juntavam para ouvir aquela nova música. Em pouco tempo,como havia sonhado, o jovem músico estava tocando para um grupo de pessoas dançarem de forma descontraída e alegre. As noites daquela estalagem foram ficando cada vez mais animadas e novas músicas eram criadas com a vibrante participação de quem estava lá para ver um novo instrumento que tocava uma nova música. Certo dia,inspirado pelas palmas que acompanhavm o músico, um homem resolveu subir ao "palco" e complementar o som da guitarra improvisando toques de talheres em pratos e batucando em uma caixa de madeira. Dias depois, A música ficou mais vibrante ainda com batidas ritimadas que passaram a fazer parte das composições da guitarra.

Finalmente a madeira nobre havia se tornado um instrumento diferente e era o astro principal de um novo tipo de música. E assim nasceram o ROCK e a guitarra que até hoje movimentam pessoas e são um filosofia de vida.


PS: O termo luthier (lê-se lutiê) tem sua origem na palavra em francês para "fabricante de alaúde", um instrumento musical de cordas trazido do oriente médio pelos Cruzados e que era chamado "Ut". Também conhecido como luteiro ou lutiê, este profissional é especializado na construção e reparo de instrumentos de corda com caixa de ressonância, tal como violão e violino, sopro, percussão e teclado. Ele regula, restaura, transforma, reforma e adapta instrumentos musicais, além de construir peças e acessórios personalizados de acordo com as exigências e vontades dos músicos. Também é sua função orientar os clientes sobre a conservação de seus instrumentos, elaborar laudos
técnicos e orçamentos.

Pensamento do dia

"Nada muda se nada muda"