Friday, March 20, 2009

"TÔ" PRA VER OUTRA IGUAL


Há 27 anos ela nos deixou. Uma overdose a levou aos 36 anos de idade em 19 de março de 1982. Naquele mês não estava aqui no Brasil, minha família havia viajado aos Estados Unidos de férias. Naquela época não havia internet e as ligações internacionais eram caríssimas e difíceis. Estar fora do país era praticamente estar “ilhado”. Fiquei sabendo da morte de Elis através de uma carta enviada por meu avô à minha mãe. Lembro-me claramente da cena: estávamos na cozinha da casa de nossos amigos americanos e minha mãe lia silenciosamente a carta até que ela parou, respirou fundo e disse: “que pena, a Elis morreu”.


Apesar de ela ter morrido quando eu tinha apenas 12 anos, por influência de minha mãe aprendi a gostar da Elis. Lembro-me que várias músicas da Pimentinha compuseram a trilha sonora da minha infância. Recordo-me também dos LPs que minha mãe comprava e gostava de ouvir em um “precário” aparelho de som da década de 70. Eu Adorava cantar Romaria e até me aventurei a tocá-la no violão quando tomei aulas deste instrumento.


Depois de 1982, durante anos, todo março lembrava-se a passagem de mais um ano sem a Elis com especiais na TV, reportagens em jornais e memoráveis vídeos sobre os festivais dos anos 60 em que ela fora lançada. Hoje, por ocasião da passagem de mais um ano sem a sua presença entre nós, a grande imprensa pouco homenageou a memória da ELIS.


Coincidentemente, ontem li um trecho da fantástica biografia de André Midani (“Música, ídolos e poder – do vinil ao Download”, Editora Nova fronteira), em que ele relata um dos pontos mais altos da carreira de Elis.


Abaixo o trecho em que André Midani (à época presidente da gravadora que detinha os direitos da cantora) relata a emoção de Elis ao cantar no Festival de Montreux, na Suíça.


“No ano seguinte, 1979, levei Elis, acompanhada por César Camargo Mariano e Hermeto Pascoal com seu grupo. A demanda por entradas era tamanha que decidimos – Claude e eu – acrescentar uma sessão à tarde. A apresentação de Hermeto, que abriria a noite para Elis, provocou uma comoção enorme, apoteótica, considerando-se o fato de que ele ainda era pouco conhecido do público europeu. Elis, Desde 1967, tinha feito muitas incurssões pela Europa e a cada apresentação em Paris, Londres, Estocolmo e Bruxelas seu prestígio aumentava, sobretudo nos meios profissionais, que a viam como sucessora em potencial da Ella Fitzgerald. Eram dez da noite quando Elis, feito um furacão, entrou no placo. Eu costumava ficar na coxia, atrás do palco, assistindo aos shows pelo circuito interno de TV. Naquela ocasião, estava saboreando de antemão um final que seria um apogeu. Fui pegar uma água; ao voltar, ouvi do stage manager:

- Olha, sua artista vai desmaiar no palco...

De fato Elis suava aos montes, estava pálida e ofegante, como que carregando o mundo nas costas. Peguei minha água, coloquei-me de quatro, e foi assim que entrei pelos fundos do palco, o mais discretamente possível, em direção a Elis. Nesse momento, Elis virou-se para o César que estava ao piano, e me vendo lá plantado com o copo na mão, precipitou-se em minha direção, bebeu água de um jato e voltou ao microfone. Suou um bocado mais e cantou como se fosse seu calvário, dramaticamente, majestosamente, e, pouco a pouco, o peso do mundo foi se aliviando de suas costas. O final do show foi espetacular e grandioso – o público ovacionou com o pedido de 11 bis...


...Depois do show, jantando no restaurante do cassino, perguntei baixinho à Elis o que havia sucedido:


- Quando pisei no palco, lembrei que Ella Fitzgerald tinha pisado dois dias antes naquele mesmo chão, lembrei que sou filha de uma lavadeira. Eu fiquei tão transtornada e queria morrer! André, você promete que não vai lançar o disco?


- Prometo.”

André Midani cumpriu a promessa enquanto Elis estava viva e relata, emocionadamente, seu dilema após a morte da cantora sobre lançar ou não o disco. Felizmente ele quebrou a promessa e o Brasil ganhou um dos melhores registros da energia e vivacidade de Elis Regina no LP cuja capa está acima.

Saudades desta filha de lavadeira que cantava como ninguém!

1 comment:

Edison Waetge Jr said...

Graaaaaaaaaande, Elis!